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Tudo o que não invento é falso *
Gabriela Motta

 

 

A realização de uma intervenção site-specific se faz do cruzamento entre o espaço de instalação da obra, as percepções do artista desse entorno e as experiências acumuladas de ambas as partes – artista e instituição. A construção da obra se dá a partir de uma escuta bastante acurada das possibilidades de diálogo e assentamento de ideias em espaços carregados de história. Muitas vezes, é preciso tolerância institucional e maturidade artística para aceitar que esse tipo de proposição nem sempre está pronto na abertura da exposição, pois depende desse "estar no mundo" para acomodar-se. Ou seja, por mais que se proliferem as intervenções do gênero no campo da arte contemporânea, nem sempre esse dispositivo alcança a intensidade poética de que é capaz.

 

O recifence Bruno Faria, ao propor um trabalho dessa natureza no Centro Cultural São Paulo, se dispôs a uma escuta do entorno, que envolveu a mudança do artista para a capital paulista. Ele se refere a esse período de convivência com a instituição como uma residência artística voluntária, já que sempre esteve em seus planos atuar no CCSP enquanto lugar de convivência e passagem dos mais diversos públicos e não enquanto espaço expositivo. De fato, é visível na trajetória do artista o seu interesse por atuar nesse limiar entre o institucional e o informal no campo da arte, sublinhando e estreitando a distância entre os pólos.

 

O artista desenvolveu duas proposições complementares no Centro Cultural. A primeira delas, Miragem, era uma intervenção sonora situada na rampa de entrada do CCSP. Uma torre com três alto-falantes que emitiam informações úteis para banhistas de uma praia. A segunda, Oásis, transformava o jardim da cobertura do prédio em um lugar para se tomar sol e ver o tempo passar, com espreguiçadeiras e guarda-sóis.

 

A despeito dos materiais constituintes dos trabalhos, os nomes também adicionavam sentido às obras, e mesmo ao lugar onde estavam instaladas. Miragem é um efeito óptico que produz a ilusão de um recanto paradisíaco em meio a um terreno inóspito e também é essa torre com alto-falantes. Essa obra diz da saída do metrô, lugar nenhum, do desejo de fugir de um cotidiano repetitivo e cansativo. Diz também que o CCSP, sua biblioteca, suas exposições, seu jardim, podem ser essa miragem não ilusória.

 

Oásis é um lugar que, em um ambiente hostil, nos proporciona prazer. Na proposição de Bruno, esse sentido se materializa através de uma série de espreguiçadeiras e guarda-sóis na cobertura do prédio. Essa intervenção nos fala da convivência, do respiro necessário do contínuo "estar fazendo alguma coisa", dos jardins sem árvores e sem bancos, das praças gradeadas e espremidas entre o "progresso".

 

Oásis e Miragem compõem juntas colocações sobre o cotidiano das cidades, sobre o infinito espaço interno de cada pessoa para sonhar e, com isso, criar um lugar mais agradável para se viver. São colocações simples, porém com uma densidade que encontramos muitas vezes na voz dos poetas capazes de discorrer sobre a magia das coisas ordinárias.

 

* Manoel de Barros

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